quarta-feira, 25 de agosto de 2010

à ninguém

se a lua estiver em leão,
é pra você.
você é meu irmão,
é o sol,
e também a estrela.
a lua amarela de agosto,
mês difícil,
mês seu,
é por você.
noite de saudade
noite de saudade tanta
que eu não deveria
escrever.
texto difícil a mim,
à ninguém.

lugar inominável

estás em outra cidade
eu estou em outro lugar
que não sei onde.
não tem privacidade
neste lugar que não tem nome.
não estou sendo o cavaleiro
da poesia,
no sentido espírita.
céu, casas germânicas,
jardins podres,
fotografia factual,
cães ladram,
uma criança chora.

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

palma sob rosa

perdão pela falta de métrica
do último poema.
digo, do último texto.
hoje veio um poema inteiro
nos olhos
no céu
numa palma
farfalhando
sob rosa caindo
em nuvens,
bois e fumaça
na estepe.
eu jamais conseguiria
transcrever
o texto do ar
para a página,
embora eu devesse apenas
agradecer por estar vivo
e ter fotografado
em centenas
de pixels
de retina
e de luz
a palma
sob rosa cálido
sobre cálido
coração.
por estar vivo
agradecer.
além de bois,
fumaças,
crianças do campo,
coisa bucólica,
melodia
de quando éramos felizes
ouço agorinha mesmo.

neste texto há certa desesperança.
perdoem a ausência de métrica.

terça-feira, 10 de agosto de 2010

lembrar

nunca se lembre de mim,
porque eu mesmo esquecerei.
os calmantes me farão esquecer
tanto de você, como de tudo.
as cordas gastas
nos acordes batidos
quando arrebentam
também se esqueceram.
que se esqueçam todos de mim
porque eu mesmo já não me lembro.
os cachorros ladram agora:
lembram-se do que sequer esqueceram.
para este texto não há fim
nunca se lembre de mim.

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

bem-te-vi

eu desejo ser livre
da liberdade do bem-te-vi
pousado alí:
no centro do universo do telhado.
eu acordo na melodia repetida
do canto do bem-te-vi
e volto a dormir.
bem-te-vi
bem-te-vi
não lhe vejo há um ano.
saudade do que se perde.
do que nem se perde também.
ser livre designa
sem saudades e sem perdas.
apenas asas nos olhos,
coração selvagem,
imensidão
de mar
e arder em vida.

terça-feira, 3 de agosto de 2010

o não dito

eu não quero morrer nunca.
digo, de morte física.
embora todos haveremos de morrer um dia.
a chuva lava a tudo.
barulhos me assustam.
eu estou descontínuo.
deslinear.
atemporal.
feliz e triste.
nada.
porque escrever?
designado que me salva
a palavra no sentido redentor,
escrevo.
insisto na palavra dita pra ninguém,
designada pelo coração.
embora a coisa
de central importância
jamais seja dita.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

crônica

treze graus na cidade de são paulo.
cinco e quarenta e oito da manhã.
aquecedor barulhento.
afoguei o relógio.
coca-cola.
disco da Elis.
óculos entre os olhos e o mundo.
mundo: tela de cristal líquido.
houve tempo em que cristal líquido
deveria ser algo místico.
cães ladram.

apesar de

idiossincrática dor
idiossincrática morte
"todos somos ilhas"
"é difícil perder-se"

óculos de grau ultrapassado.
é bom que nem se lê
o que se escreve mal,
e com certa pressa.
quase amanhece;
renascimento continental.
idiossincrático renascimento
em mim, na página.
saudade de nada.
talvez do morro da lagoa
e do dia que ainda nem nasceu.
pra ocultar a minha dor,
escreverei crônicas.
eu não estou em dor.
aquecedor, óculos, coca-cola
tira-me o sono.
tira-me o sono pés gelados,
narinas congestionadas,
por isto venho à página.
o pobre texto seria sobre
outra coisa;
clarice dizia que escrevia
como que sonhava,
que a coisa fluía
ultrapassando assim
a continuidade temática.
idiossincrática necessidade
de escrever por escrever.
salvar-me-ei de,
"apesar de".

domingo, 1 de agosto de 2010

idiossincrático

renascer no vôo do beija-flor idiossincrática dor se salva no céu no amor no ar na natureza em nada que é humano não há o que se escreva eu estou triste e perdido portanto não dá pra escrever.